ou apenas o Futuro nos dá a consciência do Passado?
segunda-feira
(Paul Valéry)
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O Meu Espaço é Sagrado!!
Eu Sou Deus.
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Ele: Eu Sou Deus!
Ela: mas Eu não acredito em Deus
Ele: Por isso é que não acreditas em mim.
sexta-feira
terça-feira
"Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!"
(Fernando Pessoa)
sábado
acho que andamos quase todos a sentir coisas parecidas, uns numa altura, outros noutra, uns com mais consciência que outros, mas na verdade todos sentimos coisas parecidas com os acontecimentos das nossas vidas.
não somos assim tão diferentes uns dos outros, nem tão individuais ou individuos unicos, acho mesmo que só nos tornamos unicos na forma como nos partilhamos e somos abraçados.
quarta-feira
domingo
O relógio marca 9:51. everything in it’s right place.
Ninguém no patamar da estação, eu subo.
Vai ser difícil me apaixonar numa discoteca, apesar de sentir estar como peixe dentro d’água, dentro dela. Mas se ela me olha, quando a olho; só a consigo olhar se não desejar. Estou já tão desesperadamente louco, tenho vergonha do desejo.
We can be heroes, just for one day. We can be us.
Não sei a que horas, ou melhor escrevendo, quando; é que o comboio vai aparecer. Já devia ter ido a andar até ao fim do patamar, vazio. E saltar.
Já é mais do que tempo de largar este patamar vazio onde me encontro, e eu não gosto de esperar.
Parei de escrever, olhei ao meu redor. A música acabou, uma mota passou, a musica começou, Calexico. Não vou saltar, estou bem sentado, descansado. Diverti-me imenso hoje, conheci-me um pouco melhor, principalmente aceitei-me, e abri uma brecha no muro que me contem, abri-me a viver a vida, procurá-la. O que me parece bom, melhor.
Mesmo sabendo que sou um burguês e que não me apetece estar sentado na estação de comboios de Algés, bêbado, maluco, à espera de um comboio que me leve daqui. Quando por mim já nem sequer sei onde ou mesmo quando quero estar. Fico resignado.
Resta-me estar aqui, quando alguém passa nas minhas costas e segue e o patamar deixou de estar vazio. Continuo a não conceder à minha presença a capacidade de encher um pouco o vazio da realidade.
A música acabou, vou respirar.
Relembra o impossível de lembrar, porque nem sequer aconteceu.
Carrega o leve peso, que de leve nada tem, no facto de teres vivido o que nunca sequer apavoraste.
Se antes tivesses tido medo, medo verdadeiro, ao ponto de fugir. Mas não. Pensaste que eras forte para tudo, pensaste que até o desamor tu vencerias, a indiferença, o orgulho, a mais pérfida ilusão.
Se os horários dos caminhos de ferro de Portugal funcionarem, ainda faltam 9minutos, contados pelo meu telemóvel, para o comboio, que me vem levar daqui, que me vai fazer nascer noutra realidade qualquer, qual mulher, qual mãe, qual vagina; chegar.
No patamar são ainda 9:51, de um momento parado no tempo.
A porta vai abrir e desta vez, em vez de sair para uma outra realidade, vou entrar para essa outra verdade qualquer. Renascer, quase viver, viver novamente, depois de algum tempo morto ou mesmo estúpido.
Like a pain in the river. Caímos ao Tejo, ajoelhamo-nos de fronte dele, caímos na rua, tropeçamos na vida, caminhamos aqui, temos esperanças, somos seres humanos.
E a rapariga na pista era linda sim, e só não dançaste mais com ela porque tens vergonha do teu desejo, e desconfias sempre do desejo do outro.
És um merdas, não vales as palavras que escreves, porque nunca vives com a paixão com que as escreves.
Nem odiar consegues.
Mata-te, no silêncio.
A última vez que chorei nos braços de alguém, tinha um espelho à minha frente, e os meus braços estavam vazios. Hoje tenho outro reflexo de mim, defronte dos meus olhos, mas os braços estão cheios.
E o comboio que não chega, e a rapariga preta que já olha, e eu que já pensava noutra rapariga, que de preto pintou o meu passado.
Mas afinal o quê é que eu quero com isto? E estavam 13º às 9:51.
E eu acabei de me sentar no interior do comboio.
Quatro homens no fundo da carruagem, do lado direito.
O comboio espera a musica parar, para arrancar.
Uma rapariga dorme dois bancos por trás de mim, para a ver tenho que olhar para trás, ou posso tentar olhar por um reflexo do vidro e assim observar uma projecção da realidade.
Vou ouvir a nova musica e viajar no comboio, um pouco.
Grande noite, até no bar à espera das cervejas que nem sequer tive que verbalmente pedir, dancei, vivi a musica e sim, fui maior do que o som, fui eu.
E pronto, afinal é possível ir ao bairro alto, encontrar amigos e divertir-me com eles, sinto-me livre. E o fiscal aparece, roda a chave e com esse movimento ordena o fechar das portas, os homens saíram todos em Oeiras e o meu passe social prova que sou livre de viajar neste comboio.
E que bom seria se o céu ficasse azul e o sol nascesse, aqui.
Já o sinto, deixei de o pressentir, já o vejo quase.
Até quando me vou contentar apenas com o sonho? Ao ponto de nem sequer desejar a realidade? Se apenas o sonho me contenta, como desejar a realidade?
Desejo a utopia, a verdade das verdades, o possível apenas e só num único lugar, ontem.
Amanhã, logo se vê, logo de vive, se for melhor que hoje, óptimo, fantástico. Maravilhoso.
terça-feira
Parece-me que estou a ficar mesmo louco.
Existem dias em que sinto que o livro que leio está realmente a falar comigo, ou a musica que ouço, sabe onde estou e quem sou.
A ler no Jardim da Estrela.
"Não odeio a regularidade das flores em canteiros. Odeio, porém, o emprego público das flores. Se os canteiros fossem em parques fechados, se as árvores crescessem sobre recantos feudais, se os bancos não tivessem alguém, haveria com que consolar-me na contemplação inútil dos jardins. Assim, na cidade, regrados mas úteis, os jardins são para mim como gaiolas, em que as espontaneidades coloridas das árvores e das flores não têm senão espaço para o não ter, lugar para dele não sair, e a beleza própria sem a vida que pertence a ela.
Mas há dias em que esta é a paisagem que me pertence, e em que entro como figurante numa tragédia cómica. Nesses dias estou errado, mas, pelo menos em certo modo, sou mais feliz. Se me distraio, julgo que tenho realmente casa, lar, aonde volte. Se me esqueço, sou normal, poupado para um fim, escovo um outro fato e leio um jornal todo." (Bernardo Soares - Livro do Desassossego)